As contribuições da Constituição Federal para o acesso à justiça em seus 35 anos de existência

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A Constituição Federal brasileira, também conhecida como “Constituição Cidadã”, completa 35 anos de existência em 5 de outubro de 2023, consagrando o maior período de estabilidade institucional da história do país, ainda- que o texto tenha sofrido alterações e adaptações desde a sua promulgação em 1988.
Ao longo dessas três décadas e meia, a Carta Magna desempenhou papel fundamental na concretização do Estado Democrático de Direito.
Uma das mudanças mais significativas que introduziu foi a ampliação dos direitos fundamentais dos cidadãos, estabelecendo um conjunto abrangente de garantias individuais, sociais e coletivas, criando uma base sólida para a proteção dos direitos humanos no Brasil e reconhecendo os direitos das minorias e de grupos vulneráveis.
Os direitos fundamentais incluem, entre outros, os direitos à vida, à igualdade, à liberdade de expressão, à privacidade, à educação e à saúde. Abarcam, ainda, o acesso à justiça, que foi positivado e viabilizado por meio de inúmeros mecanismos que lhe dão efetividade.
Acesso à justiça: um direito fundamental
O acesso à justiça, enquanto direito fundamental, visa a assegurar que todos os cidadãos, independentemente da sua condição, tenham a oportunidade de buscar a proteção dos seus direitos perante o Poder Judiciário ou por meio de métodos adequados de solução de conflitos.
Trata-se de importante previsão para a promoção da justiça social e econômica e para a efetivação da democracia.
O texto constitucional traz como ideia central, que permeia uma série de dispositivos, a universalidade da jurisdição. Ele prevê, no inciso XXV do artigo 5º, o princípio da inafastabilidade, que busca garantir uma atuação irrestrita do Estado e, até mesmo, de agentes privados (por meio da conciliação, da mediação ou da arbitragem) na resolução adequada dos conflitos, evitando-se a criação de empecilhos para que a população obtenha a efetiva tutela de seus direitos.
A inafastabilidade da jurisdição é instrumento de concretização do cumprimento das leis e contribui para a pacificação social.
A partir desse núcleo duro, a Constituição assegura tantos outros direitos aos jurisdicionados, como o direito fundamental a um julgamento neutro, legal e legítimo (art. 5º, incisos XXXVII e LIII), as garantias ao devido processo legal, à ampla defesa e ao contraditório (art. 5º, incisos LIV e LV), a presunção de inocência (art. 5º, inciso LVII) e o direito ao silêncio (art. 5º, inciso LXIII).
A Constituição trouxe ainda o direito à assistência jurídica gratuita (art. 5º, inciso LXXIV), que permite ao cidadão em situação de vulnerabilidade econômica socorrer-se do Poder Judiciário sem que tenha custos para tanto.
Mecanismos de acesso à justiça
A assistência jurídica integral e gratuita é essencial para que o acesso à justiça seja, de fato, universal.
Além de propiciar a isenção de custas judiciais e despesas processuais, o que reduz, significativamente, as barreiras financeiras que podem dificultar o alcance de uma tutela efetiva, a assistência jurídica gratuita ainda assegura a gratuidade dos atos necessários ao exercício da cidadania, como a obtenção de certidões em cartórios, e da representação legal em juízo, por meio da utilização das Defensorias Públicas da União e dos Estados.
A Defensoria Pública oferece assistência jurídica gratuita àqueles que não têm condições de pagar por um advogado particular. Isso permite que mesmo os cidadãos em situação de pobreza tenham acesso à representação legal, propiciando uma paridade de armas em uma disputa judicial.
Outra previsão constitucional que contribui diretamente para o acesso à justiça é a total gratuidade para impetrar os remédios constitucionais de habeas corpus e habeas data (art. 5º, inciso LXXVII). Como tais medidas judiciais versam sobre direitos fundamentais, sua utilização por qualquer cidadão, independentemente de sua situação econômica, não é limitada pelo pagamento de custas.
A criação dos Juizados Especiais, positivada no artigo 98 da Constituição, é igualmente uma importante previsão que assegura o acesso à justiça. Esses Juizados têm por escopo tornar mais ágil a resolução de conflitos de menor complexidade e valor, por meio de procedimentos simplificados e isentos de custas. Os Juizados são uma alternativa eficaz para a desburocratização do sistema judiciário, tornando a resolução de litígios mais fácil e acessível.
Direito fundamental à razoável duração do processo
Finalmente, o acesso à justiça também é assegurado pelo direito fundamental à razoável duração do processo, introduzido na Constituição de 1988 pela Emenda Constitucional 45/2004 (artigo 5º, inciso LXXVIII). Ele assegura que a tutela dos direitos do jurisdicionado não seja apenas teórica, mas concreta, efetiva. Afinal, nas palavras de Rui Barbosa: “Justiça atrasada não é Justiça, senão injustiça qualificada e manifesta”.
Dentre as mudanças implementadas pela Emenda Constitucional nº 45 para assegurar a razoável duração do processo estão a possibilidade de responsabilização do Estado e dos magistrados pela prorrogação excessiva no curso dos processos; a determinação de proporcionalidade entre o número de juízes na unidade jurisdicional, a efetiva demanda judicial e a respectiva população; a delegação aos servidores judiciários da prática de atos de administração e atos de mero expediente sem caráter decisório; a imposição da distribuição imediata de processos em todos os graus de jurisdição; a criação da “justiça itinerante”; e a descentralização do funcionamento dos Tribunais Regionais Federais por meio da constituição de Câmaras Regionais.
Também constituem mecanismos de celeridade e desburocratização a exigência de demonstração da repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso para fins de conhecimento do recurso extraordinário, e a necessidade de observação das súmulas vinculantes do Supremo Tribunal Federal.
É inquestionável, portanto, que a Constituição Federal de 1988 teve um impacto significativo no acesso à justiça no Brasil. Ela estabeleceu as bases para um sistema jurídico mais justo e igualitário, em que todos os cidadãos têm a oportunidade de buscar a tutela de direitos, participando efetivamente da resolução de seus conflitos.
Assim, ao celebramos os 35 anos da Constituição, devemos não só exaltar essas relevantes contribuições, mas também refletir sobre novos mecanismos que possam nos ajudar a promover a pacificação social com justiça e consolidar a democracia no país.
Por Diego Herrera de Moraes e Maricí Giannico são sócios e Flávia Marangoni é advogada do escritório Mattos Filho.
Fonte: Exame, publicado em 5 de outubro de 2023 às, 07h00.
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5 de outubro de 2023 |

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