Presos são treinados para mediar conflitos em presídio de Rondônia

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Um preso acorda no meio da noite, mas não consegue andar devidamente em sua cela por ser cego devido a diabetes. Essa atitude irrita os outros detentos, que sofrem com os tropeços do colega. Uma situação como essa poderia gerar uma discussão entre os presentes, mas, na Comarca de Santa Luzia, em Rondônia, esses ocorridos passarão a ser mediados por um terceiro.
Essa é a ideia do Projeto Vida Nova, que ensina presos dos regimes fechado e semiaberto a serem mediadores de conflitos para solucionarem problemas dentro do presídio de forma pacífica. A juíza Larissa Pinho de Alencar Lima, coordenadora do projeto, conta que foram treinados para serem mediadores os presos com bom comportamento e que não cometeram falta grave nos últimos seis meses.
Todos foram indicados pelo sistema prisional para o treinamento, que durou 3 horas. Os presos também terão acompanhamento mensal para que exponham como está sendo a experiência dentro do sistema penitenciário.
A situação de conflito envolvendo o preso diabético foi uma simulação feita após aula teórica do projeto, e resultou na busca por um preso responsável pela mediação na cela para resolver o conflito proposto.
A simulação foi pausada para que os presos sugerissem quais as técnicas de mediação poderiam ser usadas naquele contexto, conforme lhes foi ensinado no treinamento. Um dos detentos disse que o mediador deveria ser imparcial e neutro na situação apresentada.
Enquanto outro afirmou que responsável pela mediação deveria usar a técnica da escuta ativa para que as partes chegassem a um acordo. Segundo Larissa Lima, a finalidade do treinamento dos presos é proporcionar um diálogo respeitoso entre eles e gerar responsabilidade. “Procuramos mostrar que eles são capazes de resolver seus próprios conflitos de forma pacífica”, diz.
De acordo com a juíza, os presos foram treinados para atuar dentro do sistema como facilitadores de solução de conflitos. “É importante deixar claro que não se trata de justiça restaurativa e sim de mediação de conflitos”, esclarece a juíza.
São voluntários do projeto: servidores, juízes estaduais, juízes federais, advogados, estudantes e os próprios apenados. “O treinamento dentro do projeto Vida Nova tem o objetivo de resgatar a autoestima, o respeito e a dignidade dos apenados”, afirma Larissa Lima.
O treinamento, explica a julgadora, deverá ocorrer duas vezes por ano, e funciona da seguinte forma: uma equipe de servidores do Judiciário de Rondônia leva à unidade prisional uma televisão e um computador com vídeos gravados por colaboradores das mais diversas habilidades e até mesmo presos.
Os conteúdos dos vídeos são exibidos durante uma hora, e, depois, os presos debatem sobre o material apresentado com a ajuda de voluntários. Ao fim de cada módulo do projeto, os participantes entregam uma redação para ser corrigida. A conclusão e o alcance positivo em cada módulo resulta ao preso um dia de remição, após ter vista ao Ministério Público e à Defensoria Pública.
Iniciativa anterior
Desde que começou, em 2016, o projeto já ganhou a adesão de outras Comarcas de Rondônia e recebeu o prêmio de menção honrosa na 5ª Edição do Prêmio Patrícia Acioli de Direitos Humanos na categoria trabalho dos magistrados. Em fevereiro do ano passado, 16 presos da Comarca de Santa Luzia do Oeste participaram de um programa de videoaulas.
Também gerido pela juíza Larissa Lima, o projeto fez com que todos os participantes fossem aprovados nas tarefas apresentadas. A estimativa era que metade deles conseguissem resultados positivos. Outra expectativa superada foi a de número de matriculados: o índice esperado era de 10% dos presos dos regimes fechado e semiaberto, mas o resultado obtido foi de 40%.
O projeto funciona por meio de aulas em vídeo exibidas em relevisões instaladas em um corredor próximo às celas. Os conteúdos são tem uma hora de duração, e, depois de assistirem, os presos debatem sobre o material apresentado com a ajuda de voluntários.
Ao fim de cada módulo, é necessário que os participantes entreguem uma redação. O material usado no curso foi elaborado especificamente para o projeto, e três módulos foram produzidos.
Dos 16 participantes, 11 estão em regime fechado. Dos outros cinco, três cumprem pena no semiaberto, e dois são presos provisórios. A maioria deles (56%) tem entre 21 e 30 anos, sendo a maior parcela concentrada entre 26 e 30 anos. Os outros sete têm entre 31 e 60 anos, divididos proporcionalmente.
A baixa escolaridade também é latente, o que aumenta a importância do projeto. Apenas um dos participantes da iniciativa tem pós-graduação, e metade dos presos não completou o ensino fundamental. Os dados também mostram que a base familiar impacta diretamente na formação dessas pessoas.
Onze dos 16 presos afirmam que o pai ou a mãe não estudou. Apesar disso, a escolaridade materna é maior (63%) do que a paterna (44%). Outra combinação prejudicial é a existência de filhos sem um meio de sustentá-los. Quase 70% dos participantes são pais, mas não tem renda.
Já os que têm renda recebem entre um e dois salários mínimos. Entre as profissões executadas fora da prisão, estão a de serviços gerais, vaqueiro, lavrador, auxiliar de produção, garçom, pedreiro, auxiliar de pedreiro, taxista, mecânico e vendedor.
Fonte: Revista Consultor Jurídico, 14 de abril de 2017, 17h32
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14 de abril de 2017 |

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